Na década dos anos 1990 a indústria de games precisou amadurecer em virtude da exposição midática negativa a respeito de alguns games. Mortal Kombat, de 1992, trazia uma violência inédita aos videogames, com muito sangue, dilacerações e explosões de corpos. Numa tentativa de preservar seu público, julgando o que seria adequado para ele, a Nintendo tomou decisão de censurar a versão para Super Nintendo, sem sangue. A versão para Mega Drive vendeu 8 vezes mais e a Nintendo não mais censurou Mortal Kombat, que viria com sua continuação ainda mais violento.
Os tempos estavam mudando e parecia não haver limites para a criatividade dos desenvolvedores, que produziam também para um público mais maduro e não apenas crianças. Não havia debate sobre o "politicamente correto" nos games naqueles tempos. Podia-se tomar um carro em Carmagedon e quanto mais atropelamentos, mais pontos. Ou ainda, em Doom, estar armado em primeira pessoa contra criaturas bestiais, usando metralhadoras, bombas e até uma serra elétrica. Ou a partir de 1997 com Grand Theft Auto fazer QUALQUER coisa, roubar um caso, pessoas, garotas de programa, enfim, não havia limites para a ação.
Houve uma pressão midiática muito grande ligando os videogames à violência. O massacre em Columbine deu mais fôlego à discussão. Aqui no Brasil houve episódio semelhante em um shopping center em que um rapaz armado atirou contra a platéia. Chamou a atenção da mídia o fato do atirador jogar Duke Nukem e repetir no banheiro do shopping ações do game. Assim, instaurou-se durante a década de 90 um grande debate a respeito do que era aceitável, o que seria censura, como adequar o conteúdo ao público consumidor e até mesmo se as empresas teriam o direito de produzir algo de gosto tão duvidoso (para dizer o mínimo à época)
A solução encontrada foi fazer um sistema de classificação etário. Não haveria limites às produções que continuariam a desfrutar do privilégio criativo e de liberdade total de expressão. Não cabe a um grupo específico julgar o conteúdo, mas apenas recomendar o público adequado para tal tendo em vista a temática presente no jogo. Cabe ao público fazer esse julgamento, e o que pode agradar a um não agradará a outros. Esse sistema evoluiu tanto que tornou-se melhor que a classificação para filmes nos EUA.
Hoje o mercado de games continua crescendo e amadurecendo. Já suplantou o setor de músicas e cinema juntos. Convive pacificamente com o sistema de classificação que longe de tolhir a liberdade de expressão mostrou-se uma ferramenta indicativa útil aos pais e aos interessados em educação.
Parece que estamos em tempos em que essa liberdade pode estar ameaçada. Em nosso país, fala-se em controle da mídia (colocam um "social" no meio como se fosse parecer coisa boa), como se já não o fizessem pelo caráter econômico (sabe quem é o maior anunciante brasileiro? o governo).
E em âmbito internacional o ataque terrorista ao Charlie Hebdo mostra-nos que devemos olhar mais seriamente essa questão e nos implicar em garantir a liberdade de expressão e imprensa de forma irrestrita.
Não foram os Beatles que tiveram seus discos queimados nos EUA após uma declaração desastrada de John Lennon? Jesus Cristo Superstar não foi escandaloso quando lançado (não obstante ser uma das peças mais poderosas já produzidas) tanto quanto A Última Tentação de Cristo ? E A Vida de Brian do Monty Python então, tão incompreendido... O que dizer de Seth McFarlane e seu Jackass e Family Guy? Ou de Jean Genet ? O que dizer de tantos artistas brilhantes e geniais perseguidos por opiniões políticas, religiosas, raciais?
Há de se provocar e de pensar.
"Je suis Charlie"
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